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Desigualdade tributária entre veículos elétricos e a combustão pressiona montadoras na China

Veículos elétricos seguem isentos de impostos e recebem incentivos, enquanto carros a combustão carregam alta carga tributária na China

China2Brazil
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Agência

Publicado em 16 de junho de 2025 às 15h57.

Os veículos a combustão continuam responsáveis pela maior parte da arrecadação tributária do setor automotivo chinês. Em 2023, os tributos cobrados desses veículos somaram trilhões de yuans, enquanto os modelos de nova energia (NEVs, na sigla em inglês) seguem isentos de diversos impostos e ainda recebem incentivos fiscais.

A diferença de tratamento tributário se intensificou com o aumento da concorrência e a crescente participação dos elétricos no mercado, ampliando o debate sobre a necessidade de uma política de “igualdade de direitos” entre as duas categorias.

As críticas de Cui Dongshu e Li Fenggang

Em 11 de junho, Cui Dongshu, secretário-geral do Comitê de Informações do Mercado de Veículos de Passageiros da Associação Chinesa de Circulação Automotiva, afirmou em entrevista que não compraria um carro elétrico. Ele justificou a posição citando o sistema desigual de preços e impostos. Segundo Cui, o carro a combustão é taxado como item de luxo e carrega a maior parte da carga tributária do setor, enquanto os elétricos são isentos. “O carro a combustão paga impostos elevados e ainda recebe má reputação”, afirmou.

Posteriormente, Cui esclareceu que a escolha é pessoal, ligada ao perfil de uso e à moradia. Ele reforçou o apoio à estratégia nacional de desenvolvimento dos NEVs, mas apontou distorções de mercado causadas por incentivos prolongados.

A diferença de impostos também foi criticada por Li Fenggang, vice-gerente geral executivo de vendas da FAW-Audi. Durante o Salão do Automóvel da Grande Baía de 2025, ele afirmou que veículos a combustão pagam cerca de 15% a mais em impostos. Li pediu a criação de condições iguais de concorrência entre os dois tipos de veículos, sobretudo diante da guerra de preços no setor.

Estrutura tributária favorece os elétricos

Dados do setor confirmam a diferença tributária. Um carro a combustão de RMB 300 mil paga cerca de RMB 45,7 mil em impostos, considerando o imposto de aquisição (10%), o imposto sobre consumo (5% para motor 2.0T) e a taxa anual de circulação. Já os veículos de nova energia estão isentos desses três tributos.

O combustível também embute alta carga tributária. O preço da gasolina inclui cerca de 48% em impostos, enquanto a energia elétrica utilizada pelos carros elétricos não tem incidência tributária adicional. Em cinco anos, um carro a combustão pode acumular cerca de RMB 48 mil em impostos apenas com o consumo de combustível.

Além disso, os veículos a combustão enfrentam custos extras, como a placa veicular. Em Xangai, ela custa entre RMB 80 mil e RMB 100 mil. Para os elétricos, a placa verde é gratuita, embora haja espera. Os modelos elétricos também têm isenção em regras de rodízio e acesso facilitado a estacionamentos públicos em algumas cidades.

Veículos a combustão sustentam incentivos aos elétricos

A estrutura atual transfere o custo dos incentivos para os donos de veículos a combustão. Desde 2009, o imposto sobre combustíveis substituiu a taxa de conservação de estradas, o que significa que os elétricos, ao não usarem gasolina, deixam de contribuir com esse fundo, embora utilizem as vias. A expansão dos elétricos reduz essa arrecadação e pressiona o orçamento para manutenção de infraestrutura viária.

Segundo estimativas, os subsídios aos veículos de nova energia ultrapassaram RMB 100 bilhões entre 2009 e 2019. De acordo com a Administração Tributária Nacional, o total de impostos de aquisição isentos entre 2014 e 2023 ultrapassou RMB 260 bilhões. Mesmo após o fim dos subsídios nacionais, alguns governos locais continuam oferecendo benefícios.

Guerra de preços e queda na margem de lucro

Com incentivos e isenções, os NEVs ganharam competitividade e alcançaram mais de 50% de participação de mercado em 2024. A capacidade de reduzir preços levou montadoras como BYD e Tesla a dominarem as disputas de preços recentes. As montadoras de carros a combustão, por sua vez, seguiram a tendência, reduzindo as margens de lucro do setor.

Segundo o Escritório Nacional de Estatísticas, em 2024 a receita do setor automotivo cresceu 4,1%, mas os custos operacionais subiram 5,1% e o lucro caiu 8%. No primeiro trimestre de 2025, a margem de lucro caiu para 3,9%. “Se a margem cair abaixo de 4%, empresas podem reduzir investimentos em segurança”, alertou Li Fenggang.

Com o avanço dos elétricos, aumentam os apelos por políticas de equilíbrio. O presidente da Great Wall Motors, Wei Jianjun, defendeu o fim dos subsídios. Zeng Qinghong, da GAC Group, sugeriu revisar os incentivos ao alcançar 50% de penetração de mercado.

Em março, Cui Dongshu propôs cinco medidas para reduzir a desigualdade: equiparação tributária, fim de restrições à circulação de carros a combustão, unificação de padrões ambientais, estímulo a tecnologias para motores a combustão e aperfeiçoamento das regras de mercado.

Incentivos são parte de um problema mais amplo

Para Zhou Lingkun, da Deloitte China, o problema da concorrência não se resume aos impostos. Ele aponta excesso de capacidade, competição homogênea e mudanças no consumo como causas estruturais. Já Huang Tianwei, da Universidade de Ciência e Tecnologia de Wuhan, considera que os subsídios foram essenciais para desenvolver a indústria. Sem apoio, os altos custos teriam dificultado a consolidação dos NEVs.

No entanto, ele alerta para o risco de dependência prolongada dos subsídios. A redução de preços levantou dúvidas sobre inovação e qualidade. Segundo ele, é preciso evitar que a indústria se baseie em carros baratos e de baixo desempenho.

A definição do momento certo para a retirada dos incentivos divide especialistas. Huang argumenta que ainda não é hora, devido à fragilidade da infraestrutura de recarga e ao déficit de rentabilidade das montadoras elétricas. Em 2024, apenas BYD e Li Auto registraram lucro. NIO, Xiaomi Auto e XPeng acumularam prejuízos superiores a RMB 5 bilhões cada.

No cenário internacional, os elétricos chineses enfrentam barreiras tarifárias em EUA e Europa. A retirada precoce de subsídios no mercado doméstico pode reduzir a competitividade global do setor. Além disso, o país ainda não atingiu metas tecnológicas estratégicas em áreas como baterias e chips.

Cui Dongshu discorda. Para ele, mesmo sem incentivos, os elétricos manteriam o crescimento. A maturidade do setor e o baixo custo de uso tornam os modelos atrativos. Ele também destaca que 80% do mercado global ainda pertence aos carros a combustão, e que a China precisa manter força nesse segmento para expandir internacionalmente.

Zhou Lingkun aponta que as montadoras de elétricos já se preparam para o fim dos subsídios. Elas devem buscar competitividade via escala, eficiência tecnológica e novos modelos de negócio.

Transição gradual já começou

Durante as “Duas Sessões” de 2025, Zhu Huarong, presidente da Changan Automobile, propôs tributar veículos elétricos com base em peso, capacidade da bateria e emissão. Huang Tianwei sugeriu uma transição gradual, com fim dos incentivos em até cinco anos, substituindo subsídios diretos por estímulos de mercado como precificação de carbono e investimento em infraestrutura.

A política já aponta para essa direção. A partir de 2026, o teto de isenção do imposto de aquisição cairá de RMB 30 mil para RMB 15 mil, com eliminação completa prevista para 2028. Zhou Lingkun vê esse ajuste como uma forma de promover uma adaptação gradual das montadoras e incentivar a competitividade real.

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